chamo-te …
chamas-me …
não me ouves?
também eu não te ouço.
não estamos surdos
e a distância não é grande
mas não queremos ouvir.
escondemo-nos
nos gritos mudos
do silêncio negro e inquietante
que nos trama
e que por orgulho
não o quebramos.
Maria
Chamo-te
Chamo-Te porque tudo está ainda no princípio
E suportar é o tempo mais comprido.
Peço-Te que venhas e me dês a liberdade,
Que um só de Teus olhares me purifique e acabe.
Há muitas coisas que não quero ver.
Peço-Te que sejas o presente.
Peço-Te que inundes tudo.
E que o Teu reino antes do tempo venha
E se derrame sobre a Terra
Em Primavera feroz precipitado.
(Sophia de Mello Breyner Andresen)