segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

sonho


Teria passado a vida
atormentado e sozinho
se os sonhos me não viessem
mostrar qual é o caminho

umas vezes são de noite
outras em pleno de sol
com relâmpagos saltados
ou vagar de caracol

quem os manda não sei eu
se o nada que é tudo à vida
ou se eu os finjo a mim mesmo
para ser sem que decida. 

Agostinho da Silva, in 'Poemas'

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

(re)aprender ...

 
"Procuro despir-me do que aprendi,
Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos,
Desencaixotar minhas emoções verdadeiras,
Desembrulhar-me e ser eu, não Alberto Caeiro,
Mas um animal humano que a natureza produziu."
.
(Alberto Caeiro, trecho do poema "O Guardador de Rebanhos")

há dias que marcam a alma


Chuva

As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir

Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir

São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder

Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer

A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera

Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera

A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

libertar de um hábito


A gente não se liberta de um hábito atirando-o pela janela: é preciso fazê-lo descer a escada, degrau por degrau.
.
(Mark Twain)

domingo, 22 de janeiro de 2012

Poema do homem só


Sós,
irremediavelmente sós,
como um astro perdido que arrefece.
Todos passam por nós
e ninguém nos conhece.

Os que passam e os que ficam.
Todos se desconhecem.
Os astros nada explicam:
Arrefecem

Nesta envolvente solidão compacta,
quer se grite ou não se grite,
nenhum dar-se de outro se refracta,
nehum ser nós se transmite.

Quem sente o meu sentimento
sou eu só, e mais ninguém.
Quem sofre o meu sofrimento
sou eu só, e mais ninguém.
Quem estremece este meu estremecimento
sou eu só, e mais ninguém.

Dão-se os lábios, dão-se os braços
dão-se os olhos, dão-se os dedos,
bocetas de mil segredos
dão-se em pasmados compassos;
dão-se as noites, e dão-se os dias,
dão-se aflitivas esmolas,
abrem-se e dão-se as corolas
breves das carnes macias;
dão-se os nervos, dá-se a vida,
dá-se o sangue gota a gota,
como uma braçada rota
dá-se tudo e nada fica.

Mas este íntimo secreto
que no silêncio concreto,
este oferecer-se de dentro
num esgotamento completo,
este ser-se sem disfarçe,
virgem de mal e de bem,
este dar-se, este entregar-se,
descobrir-se, e desflorar-se,
é nosso de mais ninguém.

António Gedeão

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

tens que ter força ...

tens que ter força!
é a expressão repetida
por todos sempre 
e indefinidamente
escuto e vejo quem a diz 
com o olhar vidrado
na procura dessa força
que dizem existir 
e que eu me pergunto 
como fazer para a ter.

maria

Oiço correr a noite ...



Oiço correr a noite pelos sulcos  
do rosto dir-se-ia que me chama,
que subitamente me acaricia,
a mim,que nem sequer sei ainda
como juntar as sílabas do silêncio
e sobre elas adormecer.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

tempo

tempo 
dá-me tempo 
preciso de tempo 
temos muito tempo
muitas vezes o dizemos 
a pensar que de facto o tempo existe 
para tudo e para todos
e passam os minutos, as horas, os dias 
e os anos vão passando 
num rio de tempo.

porém 
numa qualquer altura 
o rio do tempo é interrompido 
sem motivo e sem qualquer razão
procuram-se justificações 
mas não se encontram 
fica apenas o corte deste tempo 
e o sentimento de que 
o tempo deveria ter sido 
no momento em que existiu.

maria

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Sem ti


E de súbito desaba o silêncio.
É um silêncio sem ti,
sem álamos,
sem luas.

Só nas minhas mãos
ouço a música das tuas.

Eugénio de Andrade

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

regressos

os lugares 
a cadeira 
os amigos
os conhecidos
os desconhecidos 
são sempre os mesmos.

regressei hoje a um desses lugares
necessitei de o fazer
e ao final do dia lá fui 
ao encontro do algo que precisava.

fiquei por lá sentada
no canto  calada e a ouvir
momentos registados pelos outros
com carinho e amizade.

Maria


escrever

dia 
local
foto
palavras...

foi difícil escrever 
o pequeno texto
mas à tua maneira 
e ao teu jeito o fiz 
sabendo que no fim 
me irias perguntar 
se assim estaria bem
o NOSSO OBRIGADO.


Maria

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

o local de trabalho

faz parte de toda uma vida
apesar de ser ou pensarmos 
que é "apenas" mais um espaço.

é preciso tirar
arrumar, limpar ...

assim o fiz 
tudo está em caixas 
agora à minha frente

olho mas não as vejo
ganho coragem para um dia 
mexer nesta também vida de trabalho
que não era minha 
mas que afinal sempre o foi.   

Maria 

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

domingo, 1 de janeiro de 2012

o trem da vida


"...a vida não passa de uma viagem de trem, cheia de embarques, alguns acidentes, surpresas agradáveis em alguns embarques e grandes tristezas em outros.

Quando nascemos entramos nesse trem e nos deparamos com algumas pessoas que julgamos que estarão sempre connosco: nossos pais. Infelizmente, isso não é verdade, em alguma estação eles descerão e nos deixarão órfãos no cominho, amizade e companhia insubstituível... Mas isso não impede que durante a viagem, pessoas interessantes e que virão a ser mais que especiais para nós embarquem.

Chegam nossos irmãos, amigos e amores maravilhosos.

Muitas pessoas tomam esse trem apenas a passeio. Outros encontrarão nessa viagem somente tristeza. Ainda outros circularão pelo trem, prontos a ajudar a quem precisa. Muitos descem e deixam saudades eternas, outros tantos passam por este trem de forma que , quando desocupam seu acento, ninguém sequer percebe.
Curioso é perceber que alguns passageiros que nos são tão queridos, acomodam-se em vagões diferentes dos nossos, portanto somos obrigados a fazer esse trajeto separados deles, o que não impede, é claro, que durante o percurso, atravessemos, mesmo que com dificuldades, o nosso vagão e cheguemos até eles... só que, infelizmente, jamais poderemos sentar ao seu lado para sempre.

Não importa, a viagem é assim, cheia de atropelos, sonhos, fantasias, esperanças, despedidas... porém, jamais retornos. Façamos essa viagem, então da melhor maneira possível, tentando nos relacionar bem com todos os passageiros, procurando, em cada um deles, o que tiverem de melhor, lembrando sempre que em algum momento do trajeto, eles poderão fraquejar e provavelmente precisaremos entender, pois nós também fraquejamos muitas vezes e, com certeza, haverá alguém que nos entenderá.

Eu me pergunto se quando eu descer desse trem sentirei saudades... acredito que sim. Separar-me de algumas amizades que fiz será, no mínimo, dolorido. Deixar meus filhos continuarem a viagem sozinhos será muito triste, mas me agarro à esperança de que em algum momento, estarei na estação principal e terei a grande emoção de vê-los chegar com uma bagagem que não tinham quando embarcaram... e o que vai me deixar mais feliz será pensar que eu colaborei para que ela tenha crescido e se tornado valiosa.

O grande mistério, afinal, é que jamais saberemos em qual parada desceremos, muito menos nossos companheiros, ou até aquele que está sentado ao nosso lado. Façamos com que a nossa estada nesse trem seja tranquila, que tenha valido a pena e que, quando chegar a hora de desembarcarmos, o nosso lugar vazio traga saudades e boas recordações para aqueles que prosseguirem a viagem da vida..."

(escrita por alguém, encontrada na net)